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Eutanásia
August 1st, 2011 by M.J. Ferreira

“O Bloco de Esquerda quer legislar sobre a morte assistida em Portugal. Concorda com a legalização da eutanásia?”
Esta era a questão que o site da Sapo.pt tinha no final da semana passada para votação. Na altura em que comecei a que escrever este “post”, o “sim” tinha pouco mais que 70% da votação.

Não me surpreende que o BE apresente este tipo de propostas. Surpreende-me é que no momento que atravessamos de enorme seriedade, a necessitar de um grande esforço de todos, haja grupos que, não conseguindo fazer-se ouvir da mesma forma que outra esquerda que enche ruas de improdutividade, ache que a discussão da eutanásia tem prioridade sobre as dificuldades sociais que uma população a que se acrescem novos pobres todos os dias apresenta.

Depois da questão da interrupção voluntária da gravidez, onde digam o que quiserem dizer, é legalizada a morte de um bebé em gestação, por vontade da mãe; a eutanásia continua na mesma linha. Pretende a legalização da morte assistida a pedido do paciente.

Tal como um bebé pode ser indesejado e, por isso, deitado fora ou descartado, uma pessoa pode chegar a determinado estado em que não tem a capacidade para tratar de si própria, podendo vir a tornar-se indesejada pelos seus cuidadores ou, estando perante uma situação incurável e, por isso irreversível, não pretende sofrer a degradação a nível físico e psicológico, bem como a dependência de terceiros, escolhendo desfazer-se da vida, deitando fora o que resta depois de usar o que conseguiu aceitar.

São inúmeras as questões (éticas, morais, jurídicas, civis, religiosas, …) que a eutanásia acarreta.

Embora, seja um tema pertinente que, mais tarde ou mais cedo, será discutido a nível nacional, não me parece tão urgente esta discussão quando penso no que já temos sobre cuidados paliativos. Este campo sim, merece, do meu ponto de vista ser devidamente implementado e explicado por todo o país.

Poderão dizer-me os defensores da eutanásia: “para quê prolongar o sofrimento do que já tem um desfecho certo?”. Não se trata de prolongar, mas de apoiar e ajudar a suportar. E, nesse caso, os cuidados paliativos com toda a acção paliativa que envolvem, são cuidados de saúde interdisciplinares, rigorosos e humanizados que se destinam, não só a a intervir activamente no sofrimento dos doentes avançados e incuráveis e/ou muito graves, como dos seus familiares. Têm como objectivo proporcionar aos doentes e aos que lhe são próximos, não só dignidade, como a máxima qualidade de vida possível. Ajudam a aceitar a inevitabilidade da morte não prolongando o sofrimento mas, também, não a provocando.

Apesar dos esforços dos profissionais e dos apelos de dezenas de milhares de cidadãos, os cuidados paliativos estão longe de ser uma realidade para a maioria dos que deles necessitam. Depois, nem todas as doenças estão neste momento indicadas pelo SNS para poderem beneficiar de cuidados e acção paliativa. Por isso mesmo, sem que estes cubram todos os casos possíveis e estejam ao alcance de todos, parece-me prematuro discutir algo radical como a decisão da própria morte.

A dignidade da vida é algo que está inerente à nossa Criação e, em termos constitucionais, não só a merecemos como a ela temos direito. O Estado deve estar comprometido em proporcionar aos cidadãos a sua defesa intransigente no interesse e salvaguarda do bem comum.

A dignidade da vida, ao contrário do que muitos querem fazer acreditar, nunca é defendida por sociedades com mentalidade individualista, hedonista e utilitária, onde o egoísmo e os prazeres imediatos têm influído no comportamento das pessoas, fazendo-as agir nas atitudes do dia-a-dia contra a dignidade da vida e a própria essência da sociedade – a família.

Este tipo de sociedades pretende descartar o difícil, o indesejado, o exigente, por via de soluções que implicam desistência, a renúncia à própria vida. Defendem, em substituição, a dignidade da morte com o que chamam de morte digna. Mas não há mortes dignas ou indignas. Em relação à morte, devemos aprender a aceitar que a vida tem limites e que termina naturalmente na morte. Por isso, a defesa de uma “morte digna” não é mais que um nome “bonito” para uma mentalidade anti-vida.

Na realidade, esta mentalidade anti-vida, a que a comunicação social teima em fazer bandeira de tempos a tempos, habitualmente servindo-se de imagens fortes de enorme sofrimento, influencia as pessoas a aceitarem o que não é natural e que muitas vezes contraria as suas próprias convicções mais íntimas, apelando para falsas necessidades, falsas liberdades e, sobretudo, a uma falsa felicidade.

O que é mesmo urgente, é que o acesso aos cuidados paliativos seja um direito universal e uma prática comum. Só estes são a resposta positiva e de esperança que diz não à falta de humanidade, à falta de amor e à falta de preparação, que advém muitas vezes da incapacidade de aceitar limites ou, até, da falta de formação qualificada para lidar com os que não se curam e seus familiares.

Por isso, eu defendo, uma rede nacional de cuidados paliativos porque, todos, mas mesmo todos, do mais rico ao mais pobre, temos direito, seja quais forem as nossas capacidades físicas, intelectuais, psicológicas, de doenças avançadas, incuráveis e progressivas, com situações irreversíveis, a uma vida com qualidade, a uma vida digna que, seja qual for o tempo que o nosso coração bata, termine numa “morte digna”. Isto é que eu queria que fosse uma realidade no meu País.


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