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Ser a diferença
Dec 28th, 2009 by M.J. Ferreira

Hoje de manhã nas habituais voltas de todos os dias, uma pessoa que conheço há muito tempo desejou-me, antes que não me visse mais durante esta semana, um bom ano. Palavra puxa palavra e o significado do seu desejo comportava apenas 363 dias porque ela não incluía a véspera e o dia de Natal. Esses dois dias eram, para ela, “sempre bons”.

No entanto, estes “sempre bons” não tinha um significado muito positivo. Estavam ligados a sentimentos que a levavam a considerar as pessoas hipócritas. Naqueles dois dias era tudo “bonzinho”, tudo cheio de “delicodoces” para depois, nos restantes dias do ano, se detestarem, não comunicarem entre si e se ignorarem.

Dei-lhe a minha perspectiva pessoal e desafiei-a a fazer a diferença. Não houve nada que a demovesse em relação à sua experiência pessoal frustrada em relação à família e ao seu significado. Nem o facto de ser mãe e poder ser um exemplo que alterasse a distância entre os valores que julga salutares e os que goram as suas expectativas e que vive diariamente a demoveram a agir proactivamente.

Uma família é um corpo composto por vários membros. Quando alguma coisa está mal num dos membros, o corpo vai ressentir-se e acaba por “adoecer”. Algo, em si, deteriora-se e necessita ser combatido rapidamente. Numa sociedade secular semelhante àquela em que vivemos, inseridos num contexto citadino, onde a pressão é enorme e a “luta” por um “lugar ao sol” – no emprego, nos transportes, nas contas por pagar, etc. – levam a um egoísmo desenfreado e a um exacerbado egocentrismo. Nessa peleja, o esforço dispensado acaba por fazer oposição às reais capacidades de cada um e permite valorizar aspectos perniciosos nos campos relacionais, emocionais e, até espirituais.

Muitas vezes é aplicada a técnica do “penso rápido” e ultrapassa-se sem grandes delongas as “coisinhas” que acontecem. A verdade é que não se supera coisa nenhuma e ficam por identificar e transpor os obstáculos. Antes, começa-se a amontoar uma série de outras “coisinhas” que se transforma num enorme “monte de lixo” e “ruídos” que toldam uma visão apropriada do que precisamos ter em conta e diminui drasticamente a auto-estima levando, muitas vezes, a situações de enorme tristeza e depressão. Uma fossa enorme é o resultado e, se não convenientemente preenchida, aborta o anseio por sermos a diferença num mundo que não compreendemos e, em muitas coisas, abominamos. Se a família é um corpo, para resolver as maleitas deste é preciso que todos os membros comuniquem honestamente entre si. É preciso que todos os membros sejam cúmplices no sentido do corpo crescer, amadurecer e ser um exemplo saudável que, mesmo face às dificuldades que sempre acontecem, não se deixa vencer pela apatia do silêncio, da culpa e da falta de tempo.

Deixou-me incomodada este encontro hoje de manhã. Como esta pessoa, quantas já não terão perdido a vontade de fazer a diferença, de semear no seio da sua própria família “sementes” que se possam desenvolver com os valores que da boca para fora ainda sussurram (esta pessoa diz-se cristã). Como esta pessoa, quantas não haverá vencidas pelo peso da própria impotência, o que as torna débeis demais para gritarem “não” àquilo que as rodeia. Como esta pessoa, quantas não haverá que já perderam a esperança e se encontram incapazes de perceber que os sonhos não são apenas castelos no ar; antes, estão ao alcance do nosso investimento, do nosso querer, das nossas capacidades enquanto pessoas inseridas numa família, numa comunidade.

Sendo esta pessoa uma pessoa que se diz cristã apelei igualmente ao seu sentido religioso mas até este se encontra bastante danificado face ao caos a que a sua existência chegou. São estas pessoas que diariamente se cruzam connosco que nos fazem exercitar o verbo “amar”. E tão mal tratado é este verbo entre nós. Muitas vezes. até com aqueles que nos são mais queridos, o trocamos pelo simples “gosto de ti”.

Muitas vezes, nas voltas e voltinhas que damos em cada dia, temos ao nosso alcance a possibilidade de sermos diferentes. Temos a possibilidade de amar, de estendermos a mão, de darmos um abraço. Essencialmente, temos a oportunidade de plantarmos sementes de ternura, de carinho, de solidariedade , afecto e bem-querer. Nem sempre estas sementes parecem ficar em terra firme. Não nos cabe a nós perceber que tipo de terra vão encontrar. Simplesmente, não podemos deixar de fazer a diferença, nem podemos deixar que a inactividade e o marasmo com que deparamos nos impeça de SER, de PERTENCER, de VIVER, de PARTILHAR e de AMAR.

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